Hoje venho-vos fazer uma revelação. No fundo nada que voces não estivessem já à espera. Pois é, é verdade, também eu fui um candidato autárquico, eu e mais alguns, acho que totalizávamos quatrocentos mil. Em relação a este número podem-se fazer várias análises, aliás todas as que a imagi(NAÇÃO) nos permitir, mas, parece-me a mim, existem duas leituras possíveis que sobressaem relativamente a todas as outras, a saber: 1ª O nosso país funciona, a nossa democracia está viva, a nossa ânsia de afirmação cíviva é tal que praticamente nos impele a sermos candidatos a qualquer coisa, apenas com o fito altruísta de darmos o nosso contributo para o bem estar de todos; 2ª Afinal não, o que nós queremos mesmo é um tacho. A gente até já viu que isto (o país) não funciona, então vamo-nos lá a candidatar a ver se arranjamos um tacho e o resto da malta que se lixe. Devo-vos também dizer que, no que concerne a estes dois últimos pontos de vista, sabem como é..., a doutrina divide-se...
Bom, chega de trigeversações e vamos mas é ao que interessa. Como já referi acima, também eu fui candidato autárquico e, devo assumi-lo, fui motivado apenas pela minha crença no estado de direito, no espírito republicano da coisa, na democracia, enfim, por acreditar que (no fundo, e mais fundo do que isto não me parece possível) isto funciona. Acredito também que, com a minha participação, e eleição, a vida de todos (cá em casa) pode melhorar. Assim, e para os que não tiveram a oportunidade de estar presentes, vou-vos transcrever aqui o discurso que fiz aquando da minha apresentação de candidatura.
A praça estava repeleta de gente que tinha chegado de autocarro vinda de todos os pontos do concelho. No ar pairava um cheiro adocicado a febras assadas e a couratos que eu tinha mandado distribuir pela populaça, juntamente com bandeirinhas e autocolantes com as minhas trombas estampadas. Antes de fazer a minha entrada apoteótica, as luzes apagaram-se e, dos megofones, começou a ecoar o meu hino de campanha, o "Malhão Malhão". Foi o entusiasmo generalizado. As pessoas berravam o meu nome a plenos pulmões, enquanto lhe saltavam da boca pedaços mal deglutidos de febra e courato:
- Hall, Hall, Hall!!!!!
Eu próprio quase chorei quando a minha claque de apoio que tinha vindo do lar da Santa Casa da Miséria das Brotas começou, inesperadamente, a cantar:
-Ninguém pára o Hall, Ninguém pára o Hall, Ninguém pára o Hall!!!!
Foi comovente.
Entrei então em cena, todos se levantaram e começaram a agitar, em simultâneo, os dois punhos no ar, a cabeça, enquanto saltavam e abriam e fechavam as pernas tipo polichinelo. Inesquecível. Esta cena durou quase três quartos de hora, até que eu, lindo na minha camisa de alças perfurada e já do púlpito, levantei o braço a pedir silêncio. Foi então que disse:
-Boa Noite!!!
Deviam ter visto. O mar de bandeiras. Os aplausos. A alegria. As luzes das ambulâncias que entretanto tinham chegado para levar aqueles que tinham partido o pescoço ao saudar a minha chegada. Fantástico.
- Colectivo, Colectivo, Colectivo, Colectivo!!!!
Pronto, já os tinha conquistado. A partir de agora a noite era minha. Foi quando tive a certeza que a vitória já não me escaparia. Comecei então o discurso propiamente dito.
- Povo de (nome da terrinha), eu sei que vocês sabem que eu sei que vocês sabem que eu não minto e raramento vos engano, assim, assumo, eu já passei cheques carecas. Melhor, eu já fui passar férias nas Caraíbas com o dinheiro que recolhi num peditório que fiz para ajudar as criancinhas que não têm perninhas e bracinhos e que foram abandonadas.
As pessoas choravam, aplaudiam e gritavam:
-Hall, Hall, Hall!!!!!
Disse-lhes então:
-Mais, eu já desviei fundos públicos destinados à distribuição de alimentos pelas familias mais desfavorecidas; já recebi subornos de empreiteiros para permitir a construção de centros comerciais onde estava previsto construir hospitais e jardins de infância; já subornei árbitros de futebol e de damas. Aliás, a minha vizinha tem um irmão que tem um sobrinho que tem quatro contas na Suiça, duas no Luxemburgo, uma na Madeira e três nas ilhas Cayman.
Foi a comoção generalizada, os aplausos ouviam-se a quilómetros de distância.
Continuei:
-E, já que estamos em maré de sinceridade, eu, quando era mais novo, violei o meu avô, matei a minha avó e arranquei os olhos a uma prima deficiente com o alicate de mexer as brazas.
- Vitória, Vitória, Vitória, Vitória.
Ouvia-se entre as Hostes.
Era altura de atacar o meu opositor.
-Eu não sou como o sr(nome do candidato do outro blogue), que é um homem honesto e justo!!!
Neste momento, e apenas por ouvir o nome do meu opositor, começou um côro de assobios enssurdecedor. Enquanto alguns até o vilipendiavam, e ameaçavam matá-lo quando o vissem na rua.
Aproveitei então para enaltecer algumas das minhas características mais queridas pelo povo.
- Dizia eu, ao contrário desse sr., eu sou um LADRÃO, um CORRUPTO, um ASSASSINO, um VIOLADOR, enfim, um autêntico FACÍNORA!!!!
Por esta altura já o povo rejubilava de gáudio. Os desmaios sucediam-se.
- Já Ganhou, Já Ganhou, Já Ganhou, Já Ganhou!!!!
Então, para finalizar o comício, estalou um enorme fogo de artifício que tinha sobrado da festa de passagem de ano, e que não se tinha realizado sobre o pretexto de que as contas públicas não permitiam gastos desta natureza. Ao mesmo tempo, helicópteros, alugados com verbas do fundo de apoio ao combate de fogos florestais, sobrevoavam a praça e largavam, sobre a multidão em delírio, caramelos, chocolates, bandeirinhas, caixas de contraceptivos (estão aqui incluidas deslocações pagas a clinícas privadas em Badajoz, para quando já for tarde para o contraceptivo)frigoríficos, maquinas de lavar louça e roupa, berbequins, embalagens de W.C. Pato Fresh, ucranianas, brasileiras e até algumas paquistanesas, para os mais desesperados.
Pois é.... Ah, pois é, já ganhei...ganhámos todos
2 comentários:
Já fiz isso, agora esperemos que funcione. Irra que já ando farto destes gajos. Obrigado. Tá bonito isto, tá...
Abraços fraternais camarada bandido.
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