domingo, outubro 23, 2005

A HERANÇA SALAZARISTA

Vá-se lá perceber…

O colectivo transgressão não se assumiu, de princípio, como sendo um colectivo de membro único por opção, antes sim, apresentou-se como um espaço cujas fronteiras à liberdade de expressão e de participação seriam as assimptotas que configuram os limites do pensamento de cada um, aquele conjunto de pontos intangíveis mas, na mor das vezes, gravados de forma indelével, e que definem até que ponto um individuo é afectado pelas matrizes socio-culturais padronizadas que o envolvem. No entanto, com o passar do tempo, o colectivo mantém a unicidade na unidade. Mas, diga-se, mantém, também, a unidade da unicidade. Eu. Não se trata de um orgulhosamente só, não, apenas as circunstâncias assim o ditaram.

Refira-se que o facto de o colectivo se resumir a mim enquanto consequência directa das circunstâncias, não implica uma intervenção do acaso, porque esse, o acaso, ainda vai ter de me provar, objectivamente, que existe. Quero com isto dizer que, assumo, as circunstâncias foram e são, na maioria das vezes, resultado da minha inacção, inacção que acarreta, por inerência à sua natureza de acção passiva, o ónus de suportar as consequências que decorrem de não agir. No fundo, todos nós acabamos muitas vezes por não agir, mais não seja quando delegamos, quer no acaso para alguns, quer num qualquer ente superior de difícil, para não dizer impossível, comprovação existencial para outros, quer, ainda, para os que se limitam a balizar, de forma estrita, o seu comportamento pelas linhas mestras dos quadros normativos que os envolvem num limbo de estupidez esclarecida e que resultam, obrigatoriamente, de um legado em forma de espartilho comunitário.

Contudo, nas situações em que a culpa das penas que padecemos possa, de alguma forma, e à primeira vista, ser imputável a outros, é sempre possível argumentar que a inexistência de culpa directa pode implicar uma responsabilização do acaso. É, é o caso de se ser português. “Pois é, eu não tenho culpa de ter nascido aqui!”. Animal. Pois é, não tens tu, mas tem o teu avô!!! O teu rico avozinho podia muito bem ter arrancado à busca de melhores paragens, ou, até, ter optado por poupar às gerações vindouras a desgraça da portugalidade. Assim, mesmo aqui existe um culpado que não o acaso, o pobre do avô.

Uma ressalva, eu não pretendo ser mal entendido. Portugal não é um país atrasado mental por acaso. Eu considero que o facto de termos vivido séculos encerrados entre o mar e os cabrões dos espanhóis contribuiu de sobremaneira para a estupidez lusitana. De tal forma, que ao fim de todo este tempo nos tornámos num povo geneticamente estúpido.

É verdade, nós somos mesmo muito estúpidos. De outra forma não é possível compreender aquilo que alguns querem tentar compreender. Portugal é um país que faz na prática aquilo que em teoria parece impossível. Funciona. Ou melhor, vai funcionando. Para cúmulo, ainda há quem enalteça o espírito do desenrascanço (tipicamente português para algumas mentes mais brilhantes), como se se tratasse de uma virtude a preservar. “Sim, planear para quê? Projectar para quê? Quando chegar a altura de decidir a malta desenrasca-se!” Animal.

Pois, pois é. Só que o pior é que sempre vão surgindo uns tipos que se apercebem da nossa debilidade genética, e, quando damos por isso, lá está o burro do portuga a levar nas orelhas, a ser violentamente comido, e a afirmar peremptoriamente que a ele ninguém o engana. “Isso é que não, cá a mim ninguém me engana! Já agora, ó Zé, dá aí mais uma mini e um pratinho de tremoços”. Animal. Para mim foi o que aconteceu com o António, o Oliveira, pois o Salazar. Chegou, vindo sabe-se lá de onde, a um “país” de brutos à estalada por tudo e por nada. Deve ter pensado: “Irra, que ainda são mais estúpidos do que eu pensava. E agora o que é que eu faço?”. “Já sei, mato alguns por não concordarem comigo, outros mando-os para a guerra, que por lá hão-de concerteza alguns ficar. Posso também incentivar a fuga de outros.” Os que cá ficaram, olha, se calhar era melhor que tivessem ido prá guerra.

Todos nós temos um exército de avós que sabem o nome dos rios todos na ponta da língua, mas não fazem a mínima ideia de para quê é que eles servem. Pura e simplesmente não são capazes de articular um raciocínio. Mas nós, os netos, é que somos burros, apenas porque não sabemos o nome da porra do rio.

Assim, da união destes dois factores, a estupidez genética por um lado, e a massificação da estupidez por outro, resultou isto. Um país onde, em termos sociais, a esperteza saloia – o tal chico-espertismo – se sobrepõe a qualquer comportamento mais ético. “Oh Pá, então se gaja se conseguiu pirar pró Brasil, voltou agora, e ainda a foram deixar a casa nem teve que pagar o táxi do aeroporto, é por que ela é mesmo esperta. Eu quero lá saber que ela roube. O dinheiro não é meu. É mesmo dela é que eu gosto.” Animal. Um país pobre de espírito, triste, desprovido de valores morais. Um país onde a acusação tem primazia sobre a união, onde ainda existe um “bufo” em cada um de nós. “Aqueles trabalham sete horas e eu trabalho oito, nem pensar nisso. Isso é que era bom, andarem-me cá a enganar. Vá mas é todos a trabalhar nove horinhas, pra ver se o patrão ainda junta algum antes de fechar a fábrica e, com o dinheiro que nos vai ficar a dever, ir abrir duas empresas, uma na Madeira e outra na Roménia.” Animal.

Mas nem tudo está perdido. Portugal é, felizmente, um país moribundo. Pode ser que morra. E, como não acredito na vida para além da morte, pode ser que morra de vez. De preferência sem deixar vestígios, que quem vier não tem culpa.

O último a sair apaga a luz e fecha a porta. Se faz favor.

domingo, outubro 09, 2005

POIS É

Hoje venho-vos fazer uma revelação. No fundo nada que voces não estivessem já à espera. Pois é, é verdade, também eu fui um candidato autárquico, eu e mais alguns, acho que totalizávamos quatrocentos mil. Em relação a este número podem-se fazer várias análises, aliás todas as que a imagi(NAÇÃO) nos permitir, mas, parece-me a mim, existem duas leituras possíveis que sobressaem relativamente a todas as outras, a saber: 1ª O nosso país funciona, a nossa democracia está viva, a nossa ânsia de afirmação cíviva é tal que praticamente nos impele a sermos candidatos a qualquer coisa, apenas com o fito altruísta de darmos o nosso contributo para o bem estar de todos; 2ª Afinal não, o que nós queremos mesmo é um tacho. A gente até já viu que isto (o país) não funciona, então vamo-nos lá a candidatar a ver se arranjamos um tacho e o resto da malta que se lixe. Devo-vos também dizer que, no que concerne a estes dois últimos pontos de vista, sabem como é..., a doutrina divide-se...
Bom, chega de trigeversações e vamos mas é ao que interessa. Como já referi acima, também eu fui candidato autárquico e, devo assumi-lo, fui motivado apenas pela minha crença no estado de direito, no espírito republicano da coisa, na democracia, enfim, por acreditar que (no fundo, e mais fundo do que isto não me parece possível) isto funciona. Acredito também que, com a minha participação, e eleição, a vida de todos (cá em casa) pode melhorar. Assim, e para os que não tiveram a oportunidade de estar presentes, vou-vos transcrever aqui o discurso que fiz aquando da minha apresentação de candidatura.
A praça estava repeleta de gente que tinha chegado de autocarro vinda de todos os pontos do concelho. No ar pairava um cheiro adocicado a febras assadas e a couratos que eu tinha mandado distribuir pela populaça, juntamente com bandeirinhas e autocolantes com as minhas trombas estampadas. Antes de fazer a minha entrada apoteótica, as luzes apagaram-se e, dos megofones, começou a ecoar o meu hino de campanha, o "Malhão Malhão". Foi o entusiasmo generalizado. As pessoas berravam o meu nome a plenos pulmões, enquanto lhe saltavam da boca pedaços mal deglutidos de febra e courato:
- Hall, Hall, Hall!!!!!
Eu próprio quase chorei quando a minha claque de apoio que tinha vindo do lar da Santa Casa da Miséria das Brotas começou, inesperadamente, a cantar:
-Ninguém pára o Hall, Ninguém pára o Hall, Ninguém pára o Hall!!!!
Foi comovente.
Entrei então em cena, todos se levantaram e começaram a agitar, em simultâneo, os dois punhos no ar, a cabeça, enquanto saltavam e abriam e fechavam as pernas tipo polichinelo. Inesquecível. Esta cena durou quase três quartos de hora, até que eu, lindo na minha camisa de alças perfurada e já do púlpito, levantei o braço a pedir silêncio. Foi então que disse:
-Boa Noite!!!
Deviam ter visto. O mar de bandeiras. Os aplausos. A alegria. As luzes das ambulâncias que entretanto tinham chegado para levar aqueles que tinham partido o pescoço ao saudar a minha chegada. Fantástico.
- Colectivo, Colectivo, Colectivo, Colectivo!!!!
Pronto, já os tinha conquistado. A partir de agora a noite era minha. Foi quando tive a certeza que a vitória já não me escaparia. Comecei então o discurso propiamente dito.
- Povo de (nome da terrinha), eu sei que vocês sabem que eu sei que vocês sabem que eu não minto e raramento vos engano, assim, assumo, eu já passei cheques carecas. Melhor, eu já fui passar férias nas Caraíbas com o dinheiro que recolhi num peditório que fiz para ajudar as criancinhas que não têm perninhas e bracinhos e que foram abandonadas.
As pessoas choravam, aplaudiam e gritavam:
-Hall, Hall, Hall!!!!!
Disse-lhes então:
-Mais, eu já desviei fundos públicos destinados à distribuição de alimentos pelas familias mais desfavorecidas; já recebi subornos de empreiteiros para permitir a construção de centros comerciais onde estava previsto construir hospitais e jardins de infância; já subornei árbitros de futebol e de damas. Aliás, a minha vizinha tem um irmão que tem um sobrinho que tem quatro contas na Suiça, duas no Luxemburgo, uma na Madeira e três nas ilhas Cayman.
Foi a comoção generalizada, os aplausos ouviam-se a quilómetros de distância.
Continuei:
-E, já que estamos em maré de sinceridade, eu, quando era mais novo, violei o meu avô, matei a minha avó e arranquei os olhos a uma prima deficiente com o alicate de mexer as brazas.
- Vitória, Vitória, Vitória, Vitória.
Ouvia-se entre as Hostes.
Era altura de atacar o meu opositor.
-Eu não sou como o sr(nome do candidato do outro blogue), que é um homem honesto e justo!!!
Neste momento, e apenas por ouvir o nome do meu opositor, começou um côro de assobios enssurdecedor. Enquanto alguns até o vilipendiavam, e ameaçavam matá-lo quando o vissem na rua.
Aproveitei então para enaltecer algumas das minhas características mais queridas pelo povo.
- Dizia eu, ao contrário desse sr., eu sou um LADRÃO, um CORRUPTO, um ASSASSINO, um VIOLADOR, enfim, um autêntico FACÍNORA!!!!
Por esta altura já o povo rejubilava de gáudio. Os desmaios sucediam-se.
- Já Ganhou, Já Ganhou, Já Ganhou, Já Ganhou!!!!
Então, para finalizar o comício, estalou um enorme fogo de artifício que tinha sobrado da festa de passagem de ano, e que não se tinha realizado sobre o pretexto de que as contas públicas não permitiam gastos desta natureza. Ao mesmo tempo, helicópteros, alugados com verbas do fundo de apoio ao combate de fogos florestais, sobrevoavam a praça e largavam, sobre a multidão em delírio, caramelos, chocolates, bandeirinhas, caixas de contraceptivos (estão aqui incluidas deslocações pagas a clinícas privadas em Badajoz, para quando já for tarde para o contraceptivo)frigoríficos, maquinas de lavar louça e roupa, berbequins, embalagens de W.C. Pato Fresh, ucranianas, brasileiras e até algumas paquistanesas, para os mais desesperados.
Pois é.... Ah, pois é, já ganhei...ganhámos todos

quarta-feira, outubro 05, 2005

FELIZ(MENTE)

Quanto a vocês eu não sei, mas eu, por vezes, questiono-me acerca de coisas que me vão surgindo do esconderijo onde se encontravam para me atormentar com exestencialidades que, assumo, provavelmente não me levam a lado nenhum. Mas, afinal, quantos de nós sabemos na realidade para onde vamos? Bem, mariquices à parte, vamos ao que, por ora, interessa, que afinal é para isso que aqui não estamos.
Como já devem ter percebido, o assunto hoje está relacionado com algo que, como muitas outras coisas, está de tal forma incrustado no quotidiano que nem sequer nos lembramos de questionar. Devo dizer que é algo que já me atormenta há algum tempo, mas que só hoje me decidi a sobre ele derramar algum do meu verbo.
Eu, normalmente, sou Ateu. Pronto, anormalmente também. Um parêntesis, a questão do Ateísmo será abordada numa outra altura que eu agora não tenho tempo. Dizia eu que, normal e anormalmente, sou Ateu, agora, não deixo de sofrer influências e condicionamentos da minha envolvente socio-cultural. Nem é preciso ir muito longe para perceber isso, basta ver o nome das terrinhas que, (in)(feliz)(mente), proliferam pelo nosso país. Eu cá nem abuso da distância: São Miguel de Machede; Nossa Senhora de (irra que é demais) Machede; São Bartolomeu do Outeiro; São Braz do Regedouro; Graça do Divôr; São Pedro da Gafanhoeira; São Sebastião da Giesteira; Igrejinha; São Pedro do Corval; São Marcos do Campo; Boa-Fé; São Brissos, etc... Não vale a pena fazer uma exposição exaustiva, porque considero serem suficientes os nomes aqui apresentados para cumprirem os propósitos com que o fiz.
Assim, assumo, sou um Ateu de influência cristã, podia ser um Ateu de influência islâmica, budista ou até, quem sabe, um ateu monopandeístapagão, mas não, sou um ateu de influência cristã. Seja lá isso o que for, sou e pronto, não se fala mais nisso. Agora, não esperem que aceite tudo com base na existência de um conjunto de premissas que outros optam (ou preferem) assumir como certas, válidas e, pior ainda, inquestionáveis.
Desta forma, causa-me alguma estranheza que aqueles que se afirmam crentes, católicos, cristãos, exerçam a sua devoção, entre outras coisas, sobre um instrumento de tortura. Sim, é dela mesmo que estou a falar, A CRUZ. A mim parece-me tão estranho como concerteza vos pareceria a vós, se agora tivessemos os comunistas a adorar a bala que matou Catarina Eufémia, ou até mesmo algum manifestante anti globalização, depois de violentamente espancado, a dizer ao policia: "por favor, dê-me o seu cacetete, para que eu possa pendurá-lo na parede da chafarica onde habito, e onde eu e os meus colegas lhe possamos prestar devoção. Por favor sr. Guarda não seja mau, bata-me com os cornos na parede à vontade, mas, por favor, dê-me o seu lindo instrumento de punição." Eu até já ouvi dizer que em Hiroshima não há janponês que se preze que não tenha em casa a sua réplica, em miniatura, da Bomba Atómica.
Bom, mas nem tudo é mau. Imaginem vocês, que se cristo, ao invés de ter sido condenado à morte por crucificação, tivesse sido condenado a morrer por SODOMÍA às mãos de um qualquer rei mago mais a dar para o escuro, o que é que mil e quinhentos milhões de pessoas em todo o mundo transportariam ao pescoço.
Até vos digo mais, ficaria lindo em qualquer igreja...
(Mente)(Feliz)
Cuidadinho com as dores na cervical